O Tarot e a Conexão com o "Livro de Thoth": Entre o Mito e a História
Um dos aspectos mais intrigantes do Tarot é sua suposta
ligação com o Livro de Thoth, uma obra mítica atribuída ao deus
egípcio Thoth (ou Djehuty, na língua original). Mas como um baralho
medieval europeu acabou associado a um conhecimento ancestral egípcio? A
resposta envolve ocultismo, equívocos históricos e simbolismo universal.
Thoth: O Deus Egípcio da Sabedoria e da
Escrita
Na mitologia egípcia, Thoth era o deus
da escrita, magia, ciência e sabedoria oculta. Dizia-se que ele
havia registrado todo o conhecimento do universo em um livro sagrado —
o "Livro de Thoth" —, que concedia poderes
sobrenaturais a quem o dominasse.
Essa lenda influenciou tradições esotéricas posteriores,
como o hermetismo (baseado nos ensinamentos atribuídos a
Hermes Trismegisto, uma fusão greco-egípcia de Thoth com o deus Hermes).
A Associação do Tarot com o Egito: Um
Erro (ou Inspiração?) do Século XVIII
Apesar de o Tarot ter surgido na Europa medieval, no
século XVIII, o estudioso Antoine Court de Gébelin publicou
uma teoria revolucionária (e controversa) em seu livro "Le Monde
Primitif" (1781). Ele afirmou que:
- O
Tarot não era um simples jogo, mas sim um "livro
egípcio" codificado, sobrevivente da destruição dos templos
do Egito.
- Os 22
Arcanos Maiores representariam os 22 hieróglifos sagrados ligados
ao Livro de Thoth.
- O "Louco" (a
carta sem número) seria uma referência a Typhon, um ser
mitológico egípcio.
Problema? Não há nenhuma
evidência histórica ou arqueológica que ligue o Tarot ao Egito Antigo. Gébelin
baseou-se em suposições e na moda da época, que via o Egito como fonte de todo
conhecimento secreto.
O Ocultismo do Século XIX e a
Consolidação do Mito
Apesar da falta de bases históricas, a ideia de que o
Tarot era um "Livro de Thoth" moderno pegou entre
ocultistas:
- Eliphas
Levi (século XIX) reforçou a ligação entre o Tarot
e a Cabala, mas manteve a ideia de que suas origens estavam em
tradições antigas, incluindo o Egito.
- Aleister
Crowley (século XX) nomeou seu próprio
baralho de "Thoth Tarot", afirmando que ele era uma
"chave" para os ensinamentos herméticos do deus Thoth.
Por Que o Mito Persiste?
A conexão entre o Tarot e o Egito Antigo, embora
historicamente incorreta, permanece por três razões:
- Simbolismo
Universal: Muitos símbolos do Tarot (como A
Justiça, A Morte e O Sol) têm paralelos em mitologias antigas,
incluindo a egípcia.
- Marketing
Ocultista: A associação com o Egito deu ao Tarot
um ar de sabedoria perdida, aumentando seu apelo místico.
- Sincretismo
Religioso: O hermetismo e a maçonaria já
misturavam influências egípcias, gregas e judaicas — o Tarot foi
"adotado" por essa tradição.
Apesar de sabermos que o Tarot não veio do Egito Antigo, a comparação com o Livro de Thoth não é totalmente vazia:
- Como
Thoth, o Tarot é visto como um registro de
sabedoria codificada.
- Como
um "livro", suas cartas contam uma narrativa
arquetípica sobre a vida humana.
Ou seja: a ligação é simbólica e filosófica,
não histórica. O Tarot medieval europeu tornou-se, com o tempo, um "Livro
de Thoth moderno" — não por origem, mas por função.
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