quinta-feira, 17 de abril de 2025

CRONOLOGIA DA DEIDADE

Desde os primórdios, as primeiras manifestações do sagrado foram femininas – deusas da terra, fertilidade e ciclos naturais, refletindo a conexão direta entre a mulher e os mistérios da criação. Com o surgimento das primeiras cidades e estruturas de poder hierárquico, um novo panteão emergiu: deuses guerreiros, legisladores e controladores, que sistematicamente subordinaram as deusas, transformando-as em consortes silenciosas ou figuras secundárias.

Mas a Deusa resistiu. Ela sobreviveu nas sombras – como Lilith, a rebelde banida; como Hécate, a senhora das encruzilhadas; como as bruxas perseguidas, que mantiveram vivo o conhecimento ancestral. Hoje, seu retorno não é apenas espiritual, mas político: um resgate da autonomia feminina sobre o corpo, a sexualidade e o sagrado. A Deusa nunca foi derrotada – foi apenas adormecida, esperando o momento de despertar.

Um resuminho da situação ao longo dos tempos:

1. Pré-História / Cultos Arcaicos (antes de 3000 AEC)

  • Deusa Mãe (Vênus de Willendorf) – Cultos paleolíticos – 30.000–10.000 AEC
  • Pachamama – Andes – 5000 AEC (culto à Terra)

2. Suméria / Mesopotâmia (3500–2000 AEC)

  • Nammu (Deusa primordial) – Suméria – 3500 AEC
  • Enlil (Deus do ar) – Suméria – 3000 AEC
  • Inanna (Deusa do amor/guerra) – Suméria – 2500 AEC

3. Egito (3100–1000 AEC)

  • Ptah (Deus criador) – Egito – 3100 AEC
  • Hathor (Deusa do céu) – Egito – 3000 AEC
  •  (Deus-Sol) – Egito – 2500 AEC

4. Vale do Indo (3300–1500 AEC)

  • Shiva Pashupati (Proto-Shiva) – Harappa – 2000 AEC
  • Deusa-Mãe Harappana – Vale do Indo – 2500 AEC

5. Grécia / Creta (2000–500 AEC)

  • Gaia (Deusa Terra) – Grécia – 2000 AEC
  • Zeus (Deus do céu) – Grécia – 1500 AEC
  • Atena (Deusa da sabedoria) – Grécia – 1200 AEC

6. Hebreus / Canaã (2000–500 AEC)

  • El (Deus supremo) – Canaã – 2000 AEC
  • Asherah (Deusa-mãe) – Canaã – 1800 AEC
  • Yahweh – Hebreus – 1000 AEC

7. Védicos / Índia (1500–500 AEC)

  • Indra (Deus da guerra) – Védico – 1500 AEC
  • Saraswati (Deusa do conhecimento) – Védico – 1200 AEC

8. Chineses / Zhou (1600–200 AEC)

  • Shangdi (Deus supremo) – Shang – 1600 AEC
  • Nuwa (Deusa criadora) – Zhou – 1000 AEC

9. Mesoamérica / Andes (1200 AEC–1500 EC)

  • Quetzalcoatl (Deus-serpente) – Astecas – 1200 EC
  • Pachamama (Deusa Terra) – Inca – 1400 EC

A Deusa nunca desapareceu — ela se reinventou. Mesmo sob o domínio de religiões patriarcais, seu arquétipo persistiu, transmutado em novas formas: nas santas cristãs (como Maria, que herdou os atributos de Isis e da Grande Mãe), nas orixás guerreiras (Oyá, senhora dos ventos e da transformação), e na face quádrupla da Deusa contemporânea (Donzela, Mãe, Fera e Anciã — esta última rompendo com a tríade wiccana para incluir a mulher selvagem e indomável). Essas manifestações não são meros vestígios, mas testemunhas de uma sabedoria feminina que resiste, mesmo quando relegada as margens da espiritualidade dominante.

Hoje, a Deusa retorna não como submissa, mas como revolucionária. Movimentos que resgatam Lilith (a exilada do Éden que virou ícone feminista), a Bruxa Anciã (curadora e detentora de conhecimento proibido) ou a Fera (a face indomável que rejeita a domesticação) mostram que seu poder nunca foi apagado — foi silenciado. A verdadeira face da Deusa é quádrupla, abrangendo a criadora, a destruidora, a protetora e a sábia — e é assim que ela reassume seu trono, não como complemento do Deus, mas como força primordial.


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